Glossário para iniciantes da corrida II

Paulo Vieira

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ASSIM COMO AQUELE SEU AMIGO QUE DIZ “te pago até a semana que vem sem falta”, posts prometidos pelo editor deste pasquim para os dias seguintes acabam ficando para as calendas.

Há cerca de sete meses, publiquei aqui o GLOSSÁRIO PARA INICIANTES DA CORRIDA, com nada menos do que 30 verbetes. Embora não tenha feito ali menção explícita de continuação, a ideia era dar sequência a esse vocabulário técnico-endorfínico logo depois.

Mas o tempo, sempre ele, passou, uma presidente caiu, um interino assumiu, o interino virou inteirinho e, waal, um lema dos tempos do marechal Deodoro passou a ser usado como divisa da Nova Era.

Mais louco, o Brasil voltou a jogar bola e prenderam o Cunha.

A restituição do meu imposto ainda não veio, a propósito, mas estou a tergiversar. Fiquem de uma vez com a sequência do Glossário para Iniciantes da Corrida.

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12 PASSOS: método empírico desenvolvido pelos editores deste pasquim para a cura do vício da corrida. Livremente inspirado em modelos do meio-oeste americano.

CAUSA: qualquer motivação supostamente fundamental, inadiável, sinequanon e, mais importante, comercialmente viável, com a qual organizadores de corrida possam embalar seu evento. Exemplos são dispensados.

CIRCUITO SESC DE CORRIDAS: opção barata ou gratuita às corridas em que é preciso pagar normalmente mais de 100 pratas pela inscrição. Há diversas provas em torno de unidades do Sesc nos muitos estados do Brasil. Como se paga pouco – ou nada –, é preciso correr também para se inscrever. Não se paga para os 5K pelo Minhocão da etapa do Sesc Consolação e para a querida meia maratona de revezamento do Sesc Ipiranga, ambas em dezembro. Veja mais AQUI.

CONGRESSO TÉCNICO: nome pomposo usado para designar as feirinhas mixurucas organizadas às vésperas das principais maratonas brasileiras. Há algumas exceções, como aquelas que têm como palestrante o Juiz Voador Iberê Dias, o especialista diletante que mais entende de corrida do Brasil – sem falar na capacidade mnemônica absurda.

FOCO: palavra coringa para designar o sucesso e também o fracasso do resultado de uma prova ou de um programa de treinamento, como se fosse disso que a corrida se tratasse.

GUERREIRO: qualificativo bastante usado por adeptos da corrida. Normalmente aplicado em causa própria, em geral por ter concluído alguma prova, seja ela de 5K ou ultramaratona. Ver FETICHE.

MAJORS: reunião das seis maratonas internacionais de maior prestígio e, consequentemente, com os maiores valores de premiação para os corredores de elite. São elas Nova York, Boston, Chicago, Berlim, Londres e Tóquio. Fazer todas, ou ao menos algumas delas, ou pelo menos uma delas, é objeto de desejo de diversos corredores amadores brasileiros. Ver FETICHE.

MEDALHA: preferimos em feijoada.

MÉTODO ABRAMOVIC: método de corrida cujo objetivo primordial é tentar preservar na memória cada pensamento, sensação e observação que são produzidos pelo corredor durante um treino ou prova – este pasquim, a propósito, prefere simplesmente a palavra “corrida”. Dada a proverbial dificuldade do método, concede-se nas fases de aprendizado a utilização de aparelhos eletrônicos. Dada novamente a dificuldade do método, não se conhecem seus resultados – nem o que seria possível fazer com eles. O método foi livremente inspirado em exercícios da performer sérvia Marina Abramovic.

MURAKAMI, HIRAKI: escritor best seller japonês, eternamente favorito para o prêmio Nobel do ano. Ficcionista de escrita perigosamente melíflua, é também maratonista diletante, tendo legado ao universo corredor o conhecido Do que eu falo quando eu falo de corrida (Editora Alfaguara), com pensamentos e observações argutas sobre suas horas no cascalho. O editor deste pasquim já esteve em seu encalço, como é possível ver na saga Do que eu falo quando eu não falo com o Murakami.

MÚSICA: aditivo bastante utilizado por corredores que supõem que, com ela, dá para ir mais longe – ou dá para ir, ponto. Alguns treinadores, como Marcos Paulo Reis, da assessoria esportiva MPR, grife bastante identificada com performance, julgam-na inapropriada para o esporte, por dificultar a concentração. Ver PLAYLIST.

PACER: marcador de ritmo em provas de corrida, não tão comum nas provas brasileiras – a nova maratona da Asics em São Paulo, miséria pouca é bobagem, contou logo com doze dessas figuras. O pacer tem por função correr estritamente num pace (ritmo) determinado, pois ele vai servir de guia para competidores que querem manter, em nome da estratégia da prova, o mesmo ritmo.  Ver PACER DA NIKE.

PACER DA NIKE: adaptação da função original do pacer das provas de corrida, que aqui atua mais como uma espécie de animador, um Titio Molina dos treinos dos clubes de corridas da Nike no Rio e em São Paulo, o Nike Run Club. Ver TITIO MOLINA.

PLANILHA: diagrama com conjunto de regras para a série semanal dos treinos de corredores amadores que encontram no Excel a motivação fundamental – e às vezes única – para correr. 

PLAYLIST: lista de músicas para fins diversos, inclusive para animar a correr. O editor deste pasquim não utiliza o recurso quando ganha o cascalho, mas nada tem contra ele. Pelo contrário, estimula sua produção e costuma convidar gente que entende do riscado para compartilhá-lo aqui, como o alfarrabista Ricardo Lombardi e o popmaníaco Lucio Ribeiro. Veja todos os playlists deste pasquim AQUI. VER MÚSICA.

PRANCHA: exercício muito popular entre corredores, tem o fito de ativar os músculos abdominais, o chamado “core”. Não é muito agradável fazê-lo, mas há coisas ainda piores. Se estiver interessado, aprenda como praticar nesta aula em vídeo do treinador Darlan Duarte, da assessoria Pacefit. (ATENÇÃO: por ordem do chefete do JQC, comentários sobre o cabelo do apresentador estão vetados) 

RELAY: “revezamento” em português, tipo de prova muito comum no atletismo de alto rendimento e que vem se tornando popular nas provas de corrida de rua por despertar o coleguismo e o interesse no trabalho em equipe. (Nossa, isso soou realmente corporativo). O Revezamento Pão de Açúcar, que agora também é patrocinado pelo achocolatado Nestlé, segue sendo um dos eventos de corrida de rua mais tradicionais do Brasil, mas há outros, como o Run the Night, da Iguana. 

RUNNER’S HIGH: “barato” da corrida provocado pela liberação de endorfinas – os opiáceos produzidos naturalmente pelo nosso corpo quando em situação de estresse físico ou psicológico. A sensação é do grande carvalho, só correndo pra saber, mas ainda assim preferimos em feijoada. Ver MEDALHA.

TATUAGEM: exatamente aquilo que você pensou, aqui aplicada à corrida, ou melhor, à epiderme do corredor. Você pode achar estranho, esdrúxulo até, mas muitos corredores amadores gostam de tornar indeléveis certas lembranças de suas provas. Vale logotipo oficial da competição, tempo de corrida e outras bizarrices.

TITIO MOLINA: tem no YouTube.

TREINADOR: figura pela qual os corredores, amadores ou não, desenvolvem estranha fixação. O editor deste pasquim não é exceção e gostaria de utilizar este espaço, conquanto entenda pouco apropriado, para dizer que desde que NONONONO se mudou para o Rio, não para (do verbo parar) mais de ouvir os discos da Maysa e do Lupicínio.

VAIDADE: é disso que se trata, em suma.

 

 

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Paulo Vieira

Influenciado pelo velho “Guia completo da corrida”, do finado James Fixx, Paulo Vieira fez da calça jeans bermuda e começou a correr pela avenida Sumaré, em São Paulo, na adolescência, nos anos 1980. Mais tarde, após longo interregno, voltou com os quatro pés nos anos 2000, e agora coleciona maratonas – 9 (4 em SP, 2 Uphill Rio do Rastro, Rio, UDI e uma na Nova Zelândia), com viés de alta – e distâncias menos auspiciosas. Prefere o cascalho de cada dia às provas de domingo e faz da corrida plataforma para voos metafísicos, muitos dos quais você encontra nestas páginas. Evoé.

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