O LIVRO-REPORTAGEM Nascido para Correr, de Christopher McDougall, best-seller nos Estados Unidos e publicado no Brasil pela editora Globo em 2010, é um bela leitura para corredores, desde que não nos incomodemos com a colcha de retalhos de assuntos e o estilo que lembra Novo Jornalismo mas também poderia passar por autoficção.
Há muita coisa lá. O autor mistura temas polêmicos da corrida, como os benefícios dos calçados sem amortecimento, apresenta os índios mexicanos tarahumaras, corredores “naturais” de longa distância, e ainda faz longas digressões para exibir estudos científicos que atestam que o homem nasceu para correr.
O fluxo narrativo se apóia justamente na complicada visita que o autor faz para correr com os tarahumaras.
Mas fixemo-nos no ponto em que McDougall se esforça para justificar o título que deu ao livro. Para sobreviver e se alimentar nas priscas eras, o homem precisava correr atrás da caça. E preferia fazer apenas isso: correr, correr e correr, até levar o animal perseguido à exaustão.
Essa espécie de hominídio tem até nome próprio no livro, trata-se do “homem corredor”.
Esse é o ponto mais interessante da obra, o capítulo 28, onde o autor dá embasamento acadêmico para mostrar que somos os mamíferos mais adaptados para a corrida, pois transpiramos, ofegamos e nossa temperatura corporal não atinge marcas perigosas.
O heroi do capítulo é um sujeito que passa décadas tentando provar essa hipótese, e chega a participar de uma caçada feita dessa maneira no Kalahari, no sul da África com uma tribo bosquinídea. Depois de andar 32K e correr outros 24K, o grupo mata de exaustão seu primeiro kudu, uma espécie de antílope.
O sujeito se chama Louis Liebenberg e o livro em que ele apresenta esse relato, o The Art of Tracking tem o pdf aberto aqui.
Ter essa vocação atávica para a corrida explicaria, na opinião de McDougall, nossa capacidade de correr maratonas e ultras mesmo em idade provecta.
Como o Orville Rogers, de 101 anos, cujos segredos de longevidade mostramos aqui.
Por conta das digressões do autor, após concluir o Nascido para correr, lembrei de uma matéria de um jornalista português do Público, ou do Expresso, um dos dois, que até começar a falar do show do Prince, lá pelo terceiro quarto de seu texto, contou toda sua experiência no metrô de Lisboa até chegar ao estádio.
(Lisboa, como sabemos, é uma cidade muito grande.)