Trem de doido

Paulo Vieira

Tag: , , , , , , , , , , , , ,

Depois de publicar aqui o que sente e o que faz a namorada de um meio maratonista obstinado, e com isso, qual uma Fernão Dias, abrir uma caminho dourado em Minas Gerais para este pasquim eletrônico, Julia Fernandes* recebeu do JQC uma outorga. A de ser correspondente do site em Minas.

Mas em vez de explorar, tornou-se explorada, como que para dar coerência à história bandeirante. Ela parece não ligar, e doravante conta de corrida desse estado de tantas coisas boas como a vaca atolada, as paisagens do Guignard e a cachaça, coisas que gostamos e que fazem a gente correr ainda mais para purgar os excessos de seu consumo.

Como eu já disse, aliás, aqui.

Destarte, é dela o texto a seguir, sobre os maluko de Barbacena, não os infelizes esquecidos dentro do lamentável Hospital Colônia de Barbacena, o campo de concentração brasileiro, de tão recente memória, mas os corredores diletantes que fazem da cidade do sul do estado um campo de diversão da endorfina.

Evoé.

O Desafio Rivelli/Foto: Divulgação
O Desafio Rivelli/Foto: Divulgação

Ao ler a frase “quando eu era criança pequena lá em Barbacena”, do que você se lembra? Talvez do Joselino Barbacena, da Escolinha do Professor Raimundo. Barbacena, a 170K de Belo Horizonte, pertinho de Tiradentes, têm mais de 130 mil habitantes e organiza cerca 15 corridas por ano – destas apenas uma faz uso de chip de cronometragem. De fevereiro a novembro, a cidade promove provas de 5 a 13 K.

Das quinze, apenas duas corridas aceitam inscrições prévias pela internet e contam com o fechamento das principais vias de trânsito para a circulação dos atletas: o Desafio Rivelli, promovido por um frigorífico local, em agosto, a tal corrida com chip, e a Corrida da Asa, da Escola Preparatória de Cadetes do Ar.

Para participar das demais provas locais deve-se preencher uma ficha antes da corrida e exibir documento de identidade. Muitas vezes, exige-se a doação de 1 kg de alimento não perecível.

Em dezembro, também dá para correr o “Desafio ao Morro”, corrida de montanha de 11K na cidade vizinha de Dores de Campos. O nome já diz tudo.

O calendário de provas de Barbacena é desenhado pela Associação dos Corredores de Rua de Barbacena (Ascorb), que surgiu para organizar melhor os eventos, antes concomitantes.

“Das quinze corridas do nosso calendário, treze são organizadas por paróquias da cidade em homenagem a seus santos. Antes da associação, as corridas eram realizadas no mesmo dia e muitas vezes em circuitos muito próximos”, conta o diretor da entidade, José Antônio da Costa.

Barbacena revela, mas talvez não segure seus corredores. “A cidade não tem assessorias esportivas e há somente uma faculdade de educação física. Quando os atletas evoluem, precisam correr em outros lugares”, diz Costa.

Para quem não conhece, a cidade está localizada na região mineira de Campo das Vertentes, ao pé da Serra da Mantiqueira, a 1160 metros de altitude. O clima frio ajuda na produção da rosa, destaque do município, que tem até uma festa dedicada à flor, no mês de outubro.

Na literatura, Barbacena é mencionada em “O Grande mentecapto” de Fernando Sabino. O personagem Geraldo Viramundo é internado no hospício e se candidata a prefeito de lá. A mistura entre realidade e ficção reflete o histórico da cidade, que abrigou o Hospital Colônia de Barbacena.

Os pacientes, a maioria sem qualquer enfermidade psíquica, eram conduzidos ao local em trens de carga, e por isso os mineiros usam tanto a expressão “trem de doido”.

*Júlia Fernandes é jornalista e correspondente do JQC em Minas Gerais.

/ 994 Posts

Paulo Vieira

Influenciado pelo velho “Guia completo da corrida”, do finado James Fixx, Paulo Vieira fez da calça jeans bermuda e começou a correr pela avenida Sumaré, em São Paulo, na adolescência, nos anos 1980. Mais tarde, após longo interregno, voltou com os quatro pés nos anos 2000, e agora coleciona maratonas – 9 (4 em SP, 2 Uphill Rio do Rastro, Rio, UDI e uma na Nova Zelândia), com viés de alta – e distâncias menos auspiciosas. Prefere o cascalho de cada dia às provas de domingo e faz da corrida plataforma para voos metafísicos, muitos dos quais você encontra nestas páginas. Evoé.

3 Comentários

  1. Avatar
    Luiz Antônio

    Trem de doido esse texto e essa jornalista! Meus parabéns à reportagem!

    Responder

  2. Avatar
    sonia maria lopes de melo

    Ótimo texto, mas agora nossa cidade ja tem um grupo de corridas,que participa de corridas tanto na cidade, como em outras cidades do país. É o grupo Calango Runners, onde temos pessoas de todas as idades, inclusive ganhando prêmios nas faixas etárias.

    Responder

  3. Avatar
    Fernanda Elias Bergamaschine

    Legal a reportagem e sua paixão pela corrida… só gostaria de acrescentar que em Barbacena existe um grupo de corrida Calango Runners que estará comemorando em novembro 2 anos. Realmente é uma cidade que ama corrida!!

    Responder

Deixe seu comentário

Seu e-mail não será publicado ou compartilhado e os campos obrigatórios estão marcados com asterisco (*).

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.