COMO TANTAS OUTRAS COISAS DA VIDA, ler é uma questão de hábito, não de tempo – correr é parecido. Aos trancos e barrancos creio ter criado o hábito da leitura (de livros físicos mormente), mas esse hábito não se fez acompanhar de outro que ser-me-ia muito útil.
Que é, para usar uma expressão que não sei se é ainda corrente, fazer o “fichamento” da leitura. Sei que em Pastoral Americana, para citar um título de um autor estado-unidense que tenho lido muito, há um personagem menor que não faz movimentos bruscos para não correr riscos de matar insetos, algo que sua religião ou sistema geral de crenças veda.
Mas não sei relacionar esse personagem com a trama – pior: não sei mais do que trata a trama.
Por isso me surpreendi ao folhear nesta manhã o velho Do que eu falo quando eu falo de corrida, o tão comentado livro de corrida do escritor, maratonista e eterno candidato a prêmio Nobel japonês Haruki Murakami.
Já li, reli e voltei a ele diversas vezes, mas hoje foi como se o examinasse pela primeira vez, já que encontrei no livro algo que me pareceu inédito.
O que o autor descreve como uma aflitiva experiência pessoal eu imaginava só acontecer comigo.
DO QUE FALO QUANDO EU NÃO FALO COM MURAKAMI
DO QUE FALO QUANDO EU NÃO FALO COM MURAKAMI – PARTE 2
DO QUE FALO QUANDO EU NÃO FALO COM MURAKAMI – EPÍLOGO
O MANUAL MURAKAMI PARA ULTRAMARATONISTAS INICIANTES – PARTE 1
O MANUAL MURAKAMI PARA ULTRAMARATONISTAS INICIANTES – EPÍLOGO
O TRIATLETA LIVREIRO SAMUEL SEIBEL E A CORRIDA QUE SALVOU A VILA MADALENA
A NATAÇÃO A SERVIÇO DA CORRIDA
PÂNICO
INSANO
A identificação não é exatamente no cascalho, mas na água.
Lá para o final do livro o autor começa a falar de suas participações em certas provas de triatlo, infecção que acomete diversos corredores quando começam a se sentir meio deformados por só darem atenção aos membros inferiores.
E eis Muraka falando por mim:
“(…) sempre que chega a hora de uma prova, ponho tudo a perder quando estou na água. Mesmo quando participei do Tinman, em Oahu, no Havaí, uma competição relativamente curta, não consegui nadar muito bem.
Entrei no mar, me preparei para nadar e de repente tive dificuldade para respirar. Eu erguia a cabeça para puxar o ar, como sempre fiz, mas não acertava o tempo. E quando não estou respirando direito, o medo toma conta de mim e meus músculos ficam tensos.
Meu peito começa a martelar, e meus braços e pernas não se movem do jeito que eu quero. Fico apavorado de enfiar a cabeça na água e começo a entrar em pânico.”
Tirando a parte do peito a martelar, ali está o editor deste pasquim escrito e escarrado. Neste ano já foram duas vezes em que, imerso na piscina olímpica do Cepeusp, aqueles 50 metros me pareceram algo impossível de ser enfrentado.
Naquelas horas também senti pânico e parei o nado, tomei fôlego e procurei expulsar do pensamento a ideia de que estava para me tornar o primeiro náufrago do mundo em piscina olímpica.
A terapia emergencial tem dado certo, apesar de eu ter cabulado a aula de hoje.