Ricardo Henrique Raymundo. No currículo, uma mara do Rio feita aos 53 anos em longos 4h34. E não muito mais.
“Não muito mais” para o povo da ortodoxia, para os pró-planilha, os amantes dos ciclos estritos e regulares. (E eu quase ia arrolando os gaúchos, mas aí me lembrei do Peninha.)
Você talvez já tenha entendido. Maratona, diz o cânone, é algo para se fazer uma vez por ano, duas se você for meio fora da curva como o Dr. Drauzio, mas o povo não gosta. Maratona demanda um ciclo de quatro meses. Você tem de subir a rodagem gradativamente e tirar o pé uma semana antes e até duas depois.
Regra, regra, regra. Zé Celso, salva a gente!
Tudo muito justo, muito bacana, talvez até científico. Mas não vale pra todo mundo.
Ricardo faz diferente. Estará novamente na Mara do Rio neste 26 de julho, domingo da graça de invernico de 25 graus, e talvez já esteja correndo outros 40K no próximo fim de semana, coisa que ele faz normalmente.
Ó só.
Jornalistas que Correm – Essa vai ser a sua segunda maratona, confere? Pensas em baixar o tempo? Tem meta?
RHR – Essa é a minha segunda maratona e vou fazer sem meta. A primeira foi sofrida, essa tem que ser divertida!
JQC – O que é se divertir? Tirar fotos? Mudar o ritmo em alguns momentos? Tentar encontrar os amigos? Qual a estratégia?
RHR – A Maratona é uma grande festa. Se você tiver curiosidade de observar o que está à sua volta, já tem aí grande fonte de distração. Estratégia acho que não tenho, é muito mais uma disposição para curtir o momento e abraçar o que de bom vier pela frente. Certamente vai ter bate-papo com os amigos, estou pensando em levar uma Garmin Virb para gravar alguma coisa.
JQC – Tenho te visto treinar distâncias que são quase como uma maratona. Você faz isso quantas vezes por semana?
RHR – Corro o que dá pra correr. O problema é falta de tempo. Todo dia eu acordo às 4h20 e saio pra correr às 5h. Nas segundas e sextas tenho que levar meus filhos pra escola, então só dá pra correr 10K, terça, quarta e quinta dá pra fazer 20K. Uma vez por semana vou ao trabalho correndo 21K e às vezes e volto no mesmo dia (Barra- São Cristóvão – Barra, o que dá 42K). Nos finais de semana tenho mais tempo e opções, então saio de casa e escolho uma direção (praia ou montanha) e vou. Até a praia da Macumba, ida e volta dá 38K.
JQC – Nunca se lesionou?
RHR – Nunca me lesionei correndo. Unhas pretas e encravadas não contam, né?
JQC – Você parece ter entrado num momento de dependência da corrida. Se deixar de correr, o que acontece?
RHR – Pode ser mesmo um caso de dependência, mas é também um aprendizado, uma vontade e um grande prazer de se sentir vivo! Se eu deixo de correr, o dia não é o mesmo, fica faltando alguma coisa.
JQC – Terminada esta maratona, quando irás correr outros 40-42K?
RHR – Provavelmente no próximo final de semana.
JQC – Há uns caras que seguem certos ditames, dizem que é preciso um ciclo de preparação de quatro meses para a maratona, um 35K a um mês do evento, polimento e quilometragem muito curta na semana da maratona. Você segue isso? Treinadores já te pediram isso?
RHR – Eu só tive um treinador, quando comecei a correr, e foi na areia da praia como terapia para me recuperar de uma lesão na cervical. Depois disso foram os livros, a web e os amigos. Como diz o (ultramaratonista Dean) Karnazes: “Listen to everyone, follow no one”. O que serve pra você pode não ser o melhor pra mim. Nunca quis que fazer da corrida uma obrigação, uma coisa chata, professoral. Tenho amigos que seguem as planilhas com fervor religioso e se dão muito bem. O meu processo foi no erro, acerto e prazer. Respeito os sinais que o meu corpo me dá e assim vou correndo. A minha preparação para domingo é descansar hoje e sábado.
JQC – Acha que correr só no asfalto vai ficar chato um dia? Vai ter de partir para a montanha ou para o triatlo?
RHR – Não acredito. Mesmo correndo o mesmo percurso todos os dias você sempre vê ou encontra alguma coisa diferente que te chama a atenção, distrai ou faz pensar, e você nunca é o mesmo do dia anterior. Cheguei a comprar uma bike, pode ser que ainda faça triatlo. Trilha e montanha até já fiz, amigos me convidam pra participar dessas corridas. O problema é o de sempre: tempo.
JQC – Finalmente: o despertador vai dar chabu como na primeira maratona?
RHR – Caraca!!! Dessa vez acho que nem vou precisar do despertador. Seja como for, obrigado pela lembrança. Já estou programando o iPhone.
Adorei!!!!! Essa coisa de seguir planilha rigorosamente torna o treino uma coisa chata e cansativa! Correr quando quer e quando dá vontade, transforma a corrida numa coisa prazerosa, divertida, com o propósito de superar os próprios limites sem “nóia“, sem obrigatoriedade nenhuma!!!! Fiquei sua fã, parabéns!!!!