Uma causa para o dia 15

Paulo Vieira

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Imagine a seguinte cena: a situação política de um determinado país torna-se insustentável e setores conservadores nacionais, saudosos do braço forte e da mão amiga, conseguem derrubar o governante. Um gabinete de emergência é montado com algumas lideranças civis em meio aos de verde-oliva, que logo se pronunciam sobre a própria transitoriedade do cargo e sobre a necessidade imediata de convocação de eleições gerais.

Que, claro, vão ficando pras calendas.

Mas o que gostaria que imaginassem: a liderança civil, aclamada como um Redentor, deixa seu inexpugnável rincão no confim do país e chega à capital federal de trem, após uma longa viagem por diversos estados. A cada plataforma, a cada apeadeiro, é saudado pelos populares com vivas e urras, pavimentando um caminho de popularidade até o destino final.

Como nos (re)conta o parça Lira Neto, tal se deu com Getúlio Vargas em 1930.

O longo nariz-de-cena agora dá lugar a uma tentativa de lead: no domingo que vem, 15 de março, o Sesc Santo André organiza uma corrida “rústica” de 6K e uma caminhada de 3K em Paranapiacaba, a vila que surgiu no meio da Serra do Mar para que os engenheiros ingleses da São Paulo Railway, que implantavam o trem até o porto do Santos, pudessem passar seus dias com algum conforto.

Não falta à vila uma réplica do Big Ben. E não faltava uma névoa espessa, um fog à inglesa, que impossibilitava o transeunte de ver alguém literalmente a um palmo do nariz.

Mas como a garoa paulistana, isso ficou pros tempos do Gegê.

Runners with a cause/Foto: Fabio Andrade-Sesc Santo André
Runners with a cause/Foto: Fabio Andrade-Sesc Santo André

O pior é que nem o trem resistiu. Só uma pequena composição turística vai aos domingos à vila, que, não custa lembrar, surgiu por conta dele. Nada, ou tudo, a lamentar: no resto do Brasil, que já foi varado de ferrovias, é exatamente assim, onde são pouquíssimos e inviáveis os percursos de trem de passageiros interurbanos.

Suponho que ninguém vai correr os 6K de domingo para pedir pela volta do protagonismo do transporte ferroviário, mas eis aí uma causa para quem precisa de uma para o dia 15.

Informações sobre a prova e inscrições a 25 mambos (a caminhada é R$ 5) no site oficial do evento, aqui.

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Mais fábulas de cunho político do JQC aqui.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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Paulo Vieira

Influenciado pelo velho “Guia completo da corrida”, do finado James Fixx, Paulo Vieira fez da calça jeans bermuda e começou a correr pela avenida Sumaré, em São Paulo, na adolescência, nos anos 1980. Mais tarde, após longo interregno, voltou com os quatro pés nos anos 2000, e agora coleciona maratonas – 9 (4 em SP, 2 Uphill Rio do Rastro, Rio, UDI e uma na Nova Zelândia), com viés de alta – e distâncias menos auspiciosas. Prefere o cascalho de cada dia às provas de domingo e faz da corrida plataforma para voos metafísicos, muitos dos quais você encontra nestas páginas. Evoé.

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