Do lado bom do ficaralho – o outro (ou a corrida como terapia)

Paulo Vieira

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Nesta manhã o sindicato dos jornalistas do estado de São Paulo tinha agendada uma assembleia no prédio da Editora Abril para discutir as demissões ocorridas no dia 1 de agosto – eu estou entre os degolados.

Não fui. Apesar de ser “protagonista” do evento, estou com certa dificuldade de voltar ao prédio onde trabalhei nos últimos 13 anos. Ainda preciso passar lá para encerrar a conta bancária, assinar a papelada da Abrilprev, restituir o dinheiro investido na academia Bioritmo (onde usei a esteira duas vezes e o chuveiro umas sete) e resgatar a carteira profissional, mas sou tomado por certo constrangimento ao me aproximar de lá e desvio a rota.

Não sei bem explicar esse constrangimento. Creio não dever nada à empresa. Minha demissão tem a ver com o enxugamento da imprensa em geral e da Abril em particular: quatro revistas foram fechadas; a que eu trabalhava, que é líder do segmento e segue saudável, teve seu comando decepado. Dançamos eu e a diretora de redação e lá foram acomodados dois jornalistas de uma das revistas extintas.

Parece-me, portanto, uma situação em que a altivez seria a reação única e automática, mas quão longe disso estou! Posso estar completamente enganado, mas creio que há algum estigma na demissão. E ele anda a pesar sobre mim estes oito dias. Pode ser fruto da violência do processo ou da cordialidade amorfa com que recebi a notícia no dia.

Mas falo, como gosta de dizer o Paulo Nogueira em seu site, de um mundo em dissolução. Há muito mais jornalistas sem vínculo empregatício do que na CLT. E isso não precisava ir muito longe para perceber: recebia, como redator-chefe da revista, diversas, dezenas possivelmente, de propostas diárias de matérias, coberturas, relatos, “parcerias”.

Então é só uma questão de adaptação ao lado bom – o outro – do Ficaralho.

A corrida, que é o de que tratamos aqui, está me ajudando nisso. Com as tardes bem mais livres, intensifiquei o exercício. Ontem, dentro do clube da Usp, corri 2:05’ fazendo tiros na reformadíssima (e recendendo a nova) pista de atletismo. Fazia a trilha de 1,1K e entrava para um pau de duas voltas na pista, outros 800 metros. Essas duas voltas cobravam seu preço e precisava reduzir o pace na trilha. Não sei a que percentual de esforço cardíaco chegava nessas horas, mas devia ser similar ou maior que o esforço em montanhas.

Aproveitei também para finalmente me inscrever na meia do Rio – a da Yescom/Globo. Ela vai ser no outro domingo, dia 18. Estava um tanto relutante, porque já miro desafios maiores. Mas, como já disse outras vezes, eis aí um pretexto bacana para ir ao Rio – como se pretexto fosse necessário. Vou tentar ser muito objetivo e detalhista no relato que farei depois neste espaço. Ou seja, bem jornalista.

Pensando bem, é melhor eu começar a ganhar dinheiro com corrida. Daqui a pouco vou começar a inventar uma viagem para correr em Camanducaia, depois em Juazeiro, em Vitória, quem sabe em Mostardas… Não vai sobrar tempo para fazer espelho, pautar reportagens, fechar, titular, legendar, escrever, reescrever, definir ações de marketing, comandar a equipe, avaliar, ouvir pedidos de OP.

A edição de agosto da Viagem e Turismo, nas bancas, no iPad e em parte no site viajeaqui.com.br traz, a propósito, uma boa despedida dessas funções: há ali, entre todas essas ações invisíveis, uma reportagem minha, assinada, sobre Tiradentes. Um fecho singelo e afetivo para uma bonita relação que vivi com a revista nesses 13 anos.

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Paulo Vieira

Influenciado pelo velho “Guia completo da corrida”, do finado James Fixx, Paulo Vieira fez da calça jeans bermuda e começou a correr pela avenida Sumaré, em São Paulo, na adolescência, nos anos 1980. Mais tarde, após longo interregno, voltou com os quatro pés nos anos 2000, e agora coleciona maratonas – 9 (4 em SP, 2 Uphill Rio do Rastro, Rio, UDI e uma na Nova Zelândia), com viés de alta – e distâncias menos auspiciosas. Prefere o cascalho de cada dia às provas de domingo e faz da corrida plataforma para voos metafísicos, muitos dos quais você encontra nestas páginas. Evoé.

5 Comentários

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    Alexandre Correa Lima

    Caro Paulo. Fiquei triste com a notícia. Faz tempo que se sabe da crise dos jornais e revistas impressos, e da migração (decimal) de receita publicitária para o meio web, mas tudo fica mais concreto quando atinge alguém que a gente conhece. Desde aquele teste de viagem de MCZ que sei que você é bom com as penas e as pernas, e saberá se virar bem, com estas ou aquelas. Abraços.

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    • Paulo Vieira
      Paulo Vieira

      “Bom com as penas e as pernas” é uma frase de antologia, Alexandre, mas assim tu me compromete! Abraço para Lavrinhas!

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      • Avatar
        Alexandre Correa Lima

        “Com as penas” ficou muito franga mesmo, como se não bastasse o desemprego… E porra, não sacaneia, é Cruzeiro, uma megalópole de quase 80.000 habitantes já.

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    Lizimar

    Grande Paulo
    Tempo não falta,para correr com todos os afazeres da casa desde que entramos para os numeros de desempregados.
    Mas boa sorte meu amigo e otimas corridas abs.

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    Priscila Yazbek

    Fiquei emocionada. E fico feliz de saber que pude trabalhar com alguém tão brilhante como você, mesmo por pouco tempo. Boa sorte nas novas corridas, Paulo!

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