“A maratona é cretinice fisiológica”

Paulo Vieira

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Iberê Dias é juiz de direito, mas se decidisse se tornar treinador de corrida dizimaria o mercado. É provavelmente o sujeito que mais entende dos benefícios e eventuais malefícios desse esporte no organismo humano. Lê adoidado – e supostamente as coisas certas.

(Se você ouvisse o que ele tem a dizer sobre alongamento, por exemplo, pensaria em processar seu treinador.)

Além disso, é brindado com uma capacidade mnemônica digna do PVC, o que ajuda a tornar sua argumentação bastante convincente. Não bastasse o que já foi dito, ele se tornou um corredor com tempos semiprofissionais em não mais de uma década, década e meia dedicada ao esporte. Já correu a meia a 1:17 e a maratona, prova que estreou em 2007, a, pqp, 2:44.

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Em abril, ele corre sua décima-segunda maratona. Mesmo assim, ele não tem palavras muito simpáticas para os 42K.

“A maratona é uma idiotice, um absurdo, uma cretinice fisiológica, sem nenhum propósito razoável.”

Ele explica:

“Fala-se muito do ‘muro’, da depleção (perda) de glicogênio a partir do 30K-35K. Mas eu diria que o muro não está relacionado exclusivamente a isso. Acho que há um bom tanto do desgaste das fibras musculares, e há o cérebro gritando que você é um idiota completo por querer continuar correndo depois de, sei lá, 35K.

Para quem está sempre procurando o limite, ainda que haja gasolina azul – glicogênio – no tanque, as fibras musculares já estão pifando, a temperatura corporal estará mais elevada, o cérebro estará remando contra para manter viva sua espécie.”

Iberê não mencionou (nem lhe foi perguntado) uma variável crítica no Brasil, a temperatura das provas. A maratona de São Paulo, em 2014, por exemplo, foi corrida a 30 graus, marca insana que agrava dramaticamente tudo o que foi dito acima. Ocorre que nosso bom juiz é useiro e vezeiro das maratonas de cidades de climas temperados, como Chicago, Boston, Roma.

Para finalizar, menciona a exceção que possivelmente confirma a hipótese do desgaste das peças. “Vejo corredores que dizem ter chegado bem e forte ao 35K e ainda ter acelerado sem problemas até o final. Realmente pode acontecer. Mas acho que quem consegue aumentar demais o ritmo na parte final da maratona – já aconteceu comigo – esteve aquém do ponto ótimo na parte inicial.”

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Paulo Vieira

Influenciado pelo velho “Guia completo da corrida”, do finado James Fixx, Paulo Vieira fez da calça jeans bermuda e começou a correr pela avenida Sumaré, em São Paulo, na adolescência, nos anos 1980. Mais tarde, após longo interregno, voltou com os quatro pés nos anos 2000, e agora coleciona maratonas – 9 (4 em SP, 2 Uphill Rio do Rastro, Rio, UDI e uma na Nova Zelândia), com viés de alta – e distâncias menos auspiciosas. Prefere o cascalho de cada dia às provas de domingo e faz da corrida plataforma para voos metafísicos, muitos dos quais você encontra nestas páginas. Evoé.

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