Uns podem achar de mau gosto, outros, inadequado, alguns, até mesmo blasfemo. Mas meu percurso de corrida no amanhecer de ontem, em São Paulo, envolveu um lugar por onde há muito eu não passava: o cemitério do Araçá.
Foi no retorno de um treino seccionado, como dizem os gaúchos, em que a primeira parte teve 20K e forte componente turístico, com passagens pelo Pacaembu, Minhocão, Viaduto do Chá, Largo do Café, Mosteiro de São Bento, Viaduto Santa Ifigênia, Ipiranga com São João, Praça da República et caterva, um trajeto no qual místicos veriam intenções ocultas e semi-inconscientes de incorporar o médico-corredor Drauzio Varella.
(Verdade: não teve a Cracolândia desta vez).
E não místicos veriam apenas uma boa oportunidade de reencontrar a história e a bela cidade oculta nas brumas de seu dia a dia.
Mas se paulista, como na Sinfonia Paulistana, a música do “Vambora/Vambora/tá na hora/Vambora”, pensa de noite nas coisas que de dia vai fazer, este falso carioca não planeja nada, nem mesmo na hora: o caminho vai surgindo por decisões tomadas à quente. Ontem, mais uma vez, as opções estavam todas na mesa – da velha Z.O. ao Piko sagrado.
Muitos corredores dizem que correm para, 14K ou 20K depois, parar de correr. A dinâmica parece bastante masoquista, mas implícitos aí estão o trabalho da endorfina e a sensação de bem-estar que irá perdurar. Sem negar esses benefícios deliciosos, eu participo de outro sistema: corro 20K para curtir a cidade e chegar, digamos, à padaria cujo folhado de queijo banco já me fascinou mais, mas sigo a consumir. Estar localizada perto dos prédios do Artacho Jurado ajuda.
Se ao invés de corredor, fosse taxista, seria um picareta que dá voltas para faturar mais 5 reais.
Agora, imagina se eu ia ficar 21K correndo pela Marginal Pinheiros – e só pela Marginal Pinheiros, como fazia um punhado de gente ontem à mesma hora. Como dizia meu pai, eu, heim.
(Já chego no Araçá, segura aí…)