Encenando Massinha

Paulo Vieira

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A ocasião faz o ladrão, dizia minha mãe. Era apenas mais um de seu lote interminável de provérbios, alguns realmente populares: de grão em grão a galinha enche o papo, um homem prevenido vale por dois, a lã não pesa ao carneiro – este era hors concours.

Questão: desaparecidos nossos pais, quem irá perpetuar esses maravilhosos ditos?

A ocasião faz o ladrão, eu e minha mãe dizíamos. Pois não é que ouço no rádio agora há pouco que hoje, 20h, no Itaú Cultural (Avenida Paulista,  149), há uma apresentação gratuita de  Palavra de Rainha, uma das 25, repetindo, 25 peças escritas pelo colega Sergio Roveri?

Um dramaturgo sem úlceras
Um dramaturgo sem úlceras

Roveri era subeditor de Variedades (Cultura) do Jornal da Tarde, o JT, o caçula do Estadão recentemente finado, e todos nós, inclusive este que vos fala, foca à época, chamávamo-lo de Massinha.

Pois bem, ao ver que o jornal – e o jornalismo – caminhava a passos largos para seu naufrágio, Massa resolveu fazer um curso de teatro. Daí estreou em 2003 com Vozes Urbanas e não parou mais. Tem prêmios Shell e Funarte no currículo, integra a delegação de escritores brasileiros que foram este fim de semana ao Salão de Paris e quatro de suas peças foram publicadas neste livro.

A parada é que Roveri concedeu ao JQC uma entrevista generosa e copiosa no começo de fevereiro e ela jaz neste computador como, digamos, vontade de potência.

Este post não traduz o que foi esse nosso encontro. Fica combinado assim: ele é só um teaser. Mais pra frente tem mais. Mas eu deixo aqui alguns insights da conversa:

– Teatro não dá grana. Massa não pode abrir mão dos frilas jornalísticos. Nem quer. Ele disse que as entrevistas que faz ajudam em seu processo criativo – ele não falou “processo criativo”, faça-se justiça ao entrevistado.

– Ele nunca sabe como vai terminar um texto. “Montadores já me pediram que eu adiantasse o final, mas eu não consigo.”

– Mais do que isso (“moreover” ficaria mais chique ou mais brega?), ele nem sempre tem uma história na cabeça: “Começo a desenvolver a peça às vezes a partir de uma cena, de uma imagem, sem saber quantos personagens ela terá. Não há nada organizado.”

– Alguns textos não surgem de uma ideia original própria. Aberdeen – um possível Kurt Cobain, por exemplo, foi escrito sob demanda. “Quem me procurou com a ideia foi o ator da peça, o Nicolas Trevijano.”

– Aquela história de ter um caderninho na mão e anotar ideias, mesmo as que vem no meio do sono? Sim, tem gente que faz isso. Massinha, por exemplo.

– Rotina de dramaturgo não difere muito da de editor do JT. Tem de acordar, ler o jornal, dar um tempo equivalente ao que seria o deslocamento da casa para a redação e aí sim começar a escrever.

– Autores de eleição:  Samuel Beckett, Harold Pinter,  Will Eno.

– Se um grupo pede para montar uma peça sua, ele permite sem mais aquela. Em geral, na faixa.

 

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Paulo Vieira

Influenciado pelo velho “Guia completo da corrida”, do finado James Fixx, Paulo Vieira fez da calça jeans bermuda e começou a correr pela avenida Sumaré, em São Paulo, na adolescência, nos anos 1980. Mais tarde, após longo interregno, voltou com os quatro pés nos anos 2000, e agora coleciona maratonas – 9 (4 em SP, 2 Uphill Rio do Rastro, Rio, UDI e uma na Nova Zelândia), com viés de alta – e distâncias menos auspiciosas. Prefere o cascalho de cada dia às provas de domingo e faz da corrida plataforma para voos metafísicos, muitos dos quais você encontra nestas páginas. Evoé.

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