Em terra de cego, quem tem Neide tem um pouco de luz

Paulo Vieira

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É DIFÍCIL SABER O QUE É MAIS ESTARRECEDOR. Se as decapitações em massa nos presídios, o silêncio sorridente de quem vê as notícias pela TV ou pelo celular – nós – ou a inação dos sucessivos governos e do sistema judiciário diante do crescimento das facções criminosas.

Nessa hora todo mundo tem o diagnóstico e o tratamento prontos – inclusive o mais atrapalhado ministro da Justiça em décadas –, mas está claro que presos não julgados ou que cometeram crimes risíveis não deveriam estar nas cadeias, aprendendo a ser bandidos.

SUBINDO O SOLIMÕES NA ROTA DO NARCOTRÁFICO

Cadeia não ressocializa nada. Até os americanos, que têm a maior população carcerária do mundo mas agora parecem decididos a se livrar desse pecha, começaram a perceber que a chave mágica da solução do problema tem dois nomes: descriminalização e legalização.

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A corrida e o esporte não vão acabar com o narcotráfico, mas neste país de gritante desigualdade social podem ajudar a deixar muita gente longe dos CDPs e das demais cadeias.

Nessas horas nunca é demais celebrar o que fez e faz a baiana Neide Santos, da ONG Vida Corrida, do Capão Redondo, Zona Sul de São Paulo, que perdeu o marido trabalhador para a violência policial e o filho adolescente para a violência social – ele foi assassinado por um garoto de 14 anos da vizinhança.

Foi voltando do cemitério, depois de enterrar o filho, que ela decidiu dar início a seu projeto social que leva esporte, educação e cidadania a levas e levas de crianças e adultos da região.

NEIDE SANTOS LEVA CORRIDA E CIDADANIA AO CAPÃO REDONDO

UMA HISTÓRIA DE SUPERAÇÃO COLETIVA NO CAPÃO REDONDO

OS MENINOS DO CAPÃO REDONDO QUE VOCÊ TAMBÉM PODE AJUDAR

JUIZ DA VARA DA INFÂNCIA E JUVENTUDE IBERÊ CASTRO LEVA CORRIDA PARA MENORES 

Em terra de cego quem tem um olho é rei, diz o ditado, e em terra onde a realidade é bruta, feia e escura o que ela faz, levar um pouco de luz, tem de ser exaltado.

“O meu mundo melhor começa com esporte”, ela já disse, e assim devem pensar também pais e filhos que fazem as aulas de corrida e esporte da ONG Vida Corrida, que assim se livram da ociosidade, para dizer o mínimo.

Não se sabe se a tecnologia, que irá desalojar ainda mais gente de seus empregos, um dia irá jogar a nosso favor. O que se sabe é que não dá para esperar muita coisa de lugar nenhum, muito menos de Brasília e do Morumbi.

Nessas horas, lenitivos como o da Neide são infelizmente ainda mais necessários.

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Paulo Vieira

Influenciado pelo velho “Guia completo da corrida”, do finado James Fixx, Paulo Vieira fez da calça jeans bermuda e começou a correr pela avenida Sumaré, em São Paulo, na adolescência, nos anos 1980. Mais tarde, após longo interregno, voltou com os quatro pés nos anos 2000, e agora coleciona maratonas – 9 (4 em SP, 2 Uphill Rio do Rastro, Rio, UDI e uma na Nova Zelândia), com viés de alta – e distâncias menos auspiciosas. Prefere o cascalho de cada dia às provas de domingo e faz da corrida plataforma para voos metafísicos, muitos dos quais você encontra nestas páginas. Evoé.

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