Outro dia, ao publicar o teste para ver que corredor você é, escrevi que uma das lacunas na minha carreira de jornalista era a redação de horóscopos. Menos mal que como obituarista até emplaquei alguma coisa. Nada, claro, que fizesse o Toninho Boa Morte morrer de orgulho. (foi mal, foi mal).
Escrevi na Folha de S. Paulo sobre Ofélia, não a afogada mais famosa da literatura, mas a da Cozinha Maravilhosa. O texto está aqui. Sua morte foi pretexto para falar de minha mãe, bem viva à época, e o artigo por isso deu mais transcendência à morte da cozinheira. Infelizmente, não foi publicado com o título sugerido: Ofélia, minha mãe.
(se me acharam pretensioso no parágrafo anterior, tem aquela piada que o Ariano Suassuna contava, e se colocava no lugar do personagem, que aqui vai resumida: no manicômio, o louco que se imagina Napoleão Bonaparte exige continência do outro.
– E quem disse que agora tem de prestar continência?
– Jesus Cristo.
E o outro:
– Eu!?)
Chegado o momento então de entrar no assunto, digo que, assim como minha mãe/Ofélia, eu me vi Paulo Vieira/David Luiz nas últimas semanas. O cabelo pode lembrar um pouco, e foi certamente por causa dele que uns moleques me disseram “Vai logo, David Luiz, o jogo tá pra começar” vinte minutos da partida fatídica.
Naquele dia eu saía para correr em São Paulo instantes antes da partida para sentir a cidade paralisada. Isso me fascina. A corrida foi curta, mas eu só fui saber do placar quando já estava 0 x 4. Não sei se isso foi bom ou ruim. Bom: minha agonia e consternação duraram menos que a de vocês, uns 27 minutos menos, calculo. Ruim: ao ver pela primeira vez a TV, já não havia mais nada para ver na TV.
E assim como David Luiz naquele jogo, eu pecaria por autossuficiência, o pior dos pecados. Se o zagueiro, que falhou terrivelmente no primeiro gol talvez por ter se esquecido justamente de que era zagueiro, eu quebrei meu pé por – talvez – não usar um tênis adequado na piramba da Serra da Balança, em Gonçalves.
Se, como diz a música, a Serra da Boa Esperança boa esperança encerra, a Serra da Balança bom balanço enseja. Eu não o tive, me dei mal, torci o tornozelo, e a conta, que poderia ter ido para os ligamentos, ficou com o osso, o quinto metatarso.
Um tênis adequado para o 4×4 talvez tivesse me poupado do infortúnio. Ou não, como deixou claro o ortopedista. “Acidente”, disse. Mas ele também mandou uma boa metáfora, dizendo que eu usava um Renault Sandero nos pés no lugar de um trail.
E dr. João Carvalho também disse que todos, mesmo os corredores de rua, deveriam fazer muito mais treinos de propriocepção do que normalmente fazemos. Talvez nisso Ivaldo Bertazzo possa nos ajudar.