EM MAIO DO ANO PASSADO deixei Manaus em direção a Tabatinga, na tríplice fronteira do Amazonas com Peru e Colômbia. Viajei a bordo de um navio de carga e passageiros, que se aboletam em redes no convés pelos até seis dias e meio da viagem.
Depois de passar pelo famoso encontro das águas do Negro com o Solimões, o navio toma o Solimões e o navega por toda sua extensão, até onde acaba o Amazonas, contra a corrente.
A embarcação, o M. Monteiro, chega a levar até 600 pessoas nesses cruzeiros, mas comigo naquela mão não iam mais de 200. Gente simples, ribeirinhos de volta para casa depois de ter levado um parente ao médico na capital, algo assim, que não se importavam com as longas paradas de seis, oito, doze horas para descarregamento de latas de cerveja, biscoitos, melancias nos portos ao longo do rio.
Muitos desses passageiros mal deixavam suas redes nesses dias e dias de viagem. Sob elas ficavam seus pertences – até o terceiro dia de viagem houve dois furtos de celular.
Fiz essa viagem à soldo da revista Viagem e Turismo, da Editora Arvorezinha, que infelizmente não a mantém disponível em seu site. Traço algumas considerações sobre ela no vídeo embebido neste post, caso você me dê a honra.
CORRENDO A 94% DE UMIDADE EM MANAUS
Tratando-se de uma reportagem de viagem, não se fala ali do narcotráfico. Mas ele esteve presente nas minhas conversas no Amazonas. Itelvino, um dos sócios da M. Monteiro, ele mesmo nascido em Tabatinga, estimou que de 30% a 40% da população da cidade está envolvida com o ilícito.
OUTRAS MATÉRIAS DE VIAGEM DESTE PASQUIM
Ele e outros membros da tripulação não se importaram de contar algumas vistorias feitas pela Polícia Federal no barco, quando ele faz o trecho de retorno para Manaus. Em busca da droga, agentes não se pejam em quebrar cantos, armários, deitar ao chão madeiras e vidros.
Emporcalham o barco.
Já houve uma morte acidental em razão de uma inspeção que achou droga no barco.
Barcos de diversos tamanhos que descem o Solimões, e o M. Monteiro não é exceção, trazem mulas, passageiros que transportam drogas.
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No “acidente pavoroso” do presídio de Manaus, todas as autoridades envolvidas reagiram de maneira previsível. O governador dizendo que no presídio “não tinha nenhum santo”, o ministro da Justiça jogando a culpa para a empresa terceirizada responsável pela carceragem e o presidente fazendo o que dele mais se espera: nada.
Tudo isso apesar de todos os relatórios, reportagens e avisos de que os presos haviam se armado, inclusive com uma metralhadora.
Para quem acha que “tem de matar vagabundo mesmo”, talvez valha a pena trocar uma ideia com o Itelvino para saber do desafio que é não sucumbir ao narcotráfico num lugar em que ele é o principal empregador, como Tabatinga. Vários amigos que cresceram com ele entraram nessa. É o caso de matá-los?
Por fim, resta dizer que fiz essa viagem num camarote com cama, frigobar e chuveiro, que é oferecido aos turistas. Está longe de ter o conforto dos navios de cruzeiro, mas são a casa do João Doria perto das redes dos ribeirinhos.
Recomendo. Veja mais detalhes aqui.