Quando sobem os créditos, há violinos, neve e a câmera se afasta num travelling e numa grua que aumenta o quadro até termos uma vista aérea ampla da cena. O clichê do clichê, como na música do Gil.
Mesmo assim, vai ser difícil segurar o choro nessa hora, especialmente se você tem filhos.
O quarto de Jack, Room, no original, é cheio de momentos lacrimosos. E não exatamente por força da situação hedionda que é o argumento do filme – o cárcere de sete anos de uma mulher, mantida ali por seu estuprador, que a visita à noite e que a supre com víveres. Com ela gerou Jack, o filho de cinco anos recém-completados com quem a vítima vive.
Por não conhecer nada para além da claraboia, a única entrada de luz do local de onde jamais saiu, Jack considera que “Quarto” é todo o mundo existente.
O argumento é da irlandesa Emma Donogue, que o escreveu a partir de relatos verídicos. Como um, recentemente revelado, de um austríaco que encarcerou a própria filha por mais de duas décadas e teve sete filhos com ela no cativeiro.
Mas a “voz” narrativa do filme é de Jack, e Emma, que também fez a adaptação de seu livro para a tela, conseguiu preservar a doçura, a candura e a beleza que preside o viver de uma criança.
É pesaroso constatar isso, mas esses valores, creio, não só deixam de presidir a vida dos adultos, como, a partir de uma certa idade, desaparecem.
Por isso é que é tão – os adjetivos aqui serão necessariamente insuficientes, escolhi um quase aleatoriamente – magnífica a oportunidade de ter um filho. De alguma forma, você redescobre esses valores.
(O que não quer dizer que passa a exercê-los, infelizmente. E isso não deve ser prerrogativa exclusiva de pais, e espero pelo bem da humanidade que não seja, mas comigo isso só se deu com a chegada das minhas marias.)
Valores tão claramente exibidos por Jack, especialmente quando ele pede para rever “Quarto” para se despedir de seus amigos.
A atuação do menino canadense Jacob Trembley é supra-humana, e talvez a missão tenha sido um passeio para ele (talvez não). “Ma”, sua mãe no filme, a atriz Brie Larson, levou o Oscar, quem sabe porque pegaria mal dar o prêmio de melhor ator para uma criança.
E nem uma palavra sobre o filme mais direi, para não embargar as vias aéreas do espectador antes do tempo.
Apenas a constatação de um paradoxo. Crianças são capazes de transformar a candura, a doçura e a delicadeza em coisas grandiosas apenas por agir com decoro.
Em outras palavras: agir como crianças.
Eis, para mim, a definição mais precisa de beleza.
Pensando bem, Jacob não merecia mesmo o Oscar.