Dos bares de Curitiba para as ultramaratonas

Paulo Vieira

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Zilma da Silva corre,corre, corre, corre...
A ultramaratonista Zilma Rodrigues da Silva

A corredora que é a grande estrela na equipe da 5 Ways, a minha atual e até aqui única assessoria esportiva, chama-se Zilma Rodrigues da Silva, tem 40 anos e é paranaense. Até fazer suas primeiras corridas de 5K e 10K ela era consultora informal de seus amigos em Curitiba. Quando queriam saber em que bar levar alguém de fora – o que tivesse o melhor tira-gosto, o certeiro para pegação, o mais sujinho -, era a ela que pediam dicas.

Hoje Zilma é uma ultramaratonista reputada. Disputou seis vezes a Comrades, prova casca-grossa anual de 89,7K que é a Caná dos ultramaratonistas, e acaba de voltar da Grécia, onde foi a única brasileira a participar da Spartathlon, onde é preciso transpor, em um dia e meio, os 246K que separam as antigas cidades-estado de Atenas a Esparta. Exatamente como teria feito Fidípides no século V a.C., na preliminar de sua corrida letal entre Atenas e Maratona. Sublinhando: 246K em 36 horas.

Zilma não conseguiu terminar, mas, diferentemente do ano passado, quando abandonou por estar sofrendo com a alimentação ruim, o problema agora foi um erro banal: por ter passado dois minutos além do tempo limite numa das estações do percurso, foi eliminada. Havia corrido 203K. “Enganei-me com o relógio, achei que estava no tempo”, disse, por telefone.

O que leva alguém a se tornar, em apenas dez anos, um corredor de tão insanas distâncias, exigindo treinos que podem chegar, num dia, a 80K? No caso dela, uma resposta é a óbvia competitividade; uma outra, a experiência de ter, em suas palavras, “chegado mais perto de Deus”.

A competitividade está mais do que explícita em sua carreira ascendente, sempre a buscar provas mais longas ou então melhorar seu tempo para um mesmo percurso. Ela me contou que sua maior decepção nestes dez anos de corridas foi ter feito um tempo inferior, em 2007, na Maratona de Curitiba, ao de seu ano anterior.

Quanto à questão da proximidade de Deus, parece que Ele se apresenta bem mais no final das provas no que no durante: “Na minha primeira Comrades, uma corredora brasileira, a Maria Bernardino, me respondia quando eu perguntava a ela onde estava a subida, que não chegava: ‘Fica quieta e agradece a Deus a cada quilômetro vencido’. Quando eu terminei, acho que tive uma visão do paraíso.”

A pergunta mais óbvia que alguém de fora faria é: “Por que tudo isso?” Mas outra possível seria: Por que não tudo isso? Diferentemente do Ultraman, Zilma jamais sofreu lesões sérias e por conta de suas performances tem patrocínios de empresas de materiais esportivos. Ela também não paga o preparador, a fisioterapia nem a academia. Por fim, um patrocinador canadense paga a inscrição de provas como a Spartathlon. Claro, é obrigada a arcar com as viagens, o que não é nada barato.

Mais importante do que isso, sua rotina diária é extenuante. Esta semana, que é praticamente de “descanso”, como disse, previa um treinamento diário médio de 13K. Perto das provas a coisa muda bastante de figura. Chega a fazer cinco “tiros”, seguidos de 10K. E mais esta: “Para treinar subida, subi e desci num sábado a Ladeira da Biologia da USP 40 vezes seguidas.”

A Ladeira da Biologia tem 1K.

Mas pergunte se ela quer outra coisa. Ela vai correr a Spartathlon em 2014 e também pretende um dia participar da Trans-Europe, cujo desafio é sair de Lisboa e chegar a Moscou em 64 dias. Sem pegar um único Talgozinho sequer. Zilma relata isso como se a tarefa fosse comezinha.

Ela ainda é boa para dar dicas dos botecos de Curitiba, mas está um pouco menos disponível para acompanhar o interessado.

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Paulo Vieira

Influenciado pelo velho “Guia completo da corrida”, do finado James Fixx, Paulo Vieira fez da calça jeans bermuda e começou a correr pela avenida Sumaré, em São Paulo, na adolescência, nos anos 1980. Mais tarde, após longo interregno, voltou com os quatro pés nos anos 2000, e agora coleciona maratonas – 9 (4 em SP, 2 Uphill Rio do Rastro, Rio, UDI e uma na Nova Zelândia), com viés de alta – e distâncias menos auspiciosas. Prefere o cascalho de cada dia às provas de domingo e faz da corrida plataforma para voos metafísicos, muitos dos quais você encontra nestas páginas. Evoé.

2 Comentários

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    Júlia Mendonça

    Que orgulho da Zilma e dessas provas maravilhosas que ela faz. Super inspiração para começar bem o sábado!!!

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  2. Avatar
    Cleia Marques,

    Nunca vi uma pessoa tão determinada como a Zilma. Quando comecei a correr em 2007 tive o prazer de ter a Zilma do meu lado dando alguma dicas, treinava as vezes com ela no Jardim Botânico em Curitiba, isso quando o treino dela era de soltura imagine… e ela dizia pisa no meu pé, pisa no meu pé só para ver se eu alcançava ela, nossa eu tinha vontade de chorar rsrsrs , mas até que resultou de alguns pódios na minha categoria na época. consegui ganhar 3 lugar , depois 2 lugar e finalmente o 1 lugar na minha categoria e tudo isso graças a Zilma Rodrigues, guardo grandes recordações. Hoje corro para manter a forma e encontrar os amigos , mas sempre que faço uma corrida mas difícil, logo lembro da Zilma ai crio forças. Parabéns Zilma Guerreira

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