Pânico

Paulo Vieira

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Em janeiro fui assistir a “Gravidade” numa sala Imax dessas. Apesar de ser uma quarta-feira à tarde, o lugar estava lotado e eu tive de ficar numa das primeiras fileiras, o que não foi a melhor experiência ergonômica da minha vida. Mas o filme é duca, como se dizia, e valeu muito a pena ter ido, mesmo naquelas condições adversas.

Espero que isto não seja um spoiler para quem ainda não viu, mas a gente vai perdendo o ar junto com a personagem de Sandra Bullock na sua completamente inverossímil e acidentada volta à Terra.

Bullock, JQC
Problema mesmo foi na hora de enfrentar as piranhas

Desde então penso em escrever sobre pânico. Você já teve algum momento de pânico ou se viu na iminência de enfrentar um? Talvez dê na mesma.

Bullock tinha de manter a calma mesmo sabendo que sua risível reserva de ar estava para acabar. Pense.

Guardadas as proporções, associei as agruras da Bullock com as minhas no teste cardiorrespiratório que fiz no ano passado. Com aquele tubo enfiado na boca, o nariz preso por um grampo e a esteira cada vez mais veloz, tive um surto, ou um princípio de surto, e abortei o exame mesmo sem atingir meu pico de esforço.

O ar não me faltaria, mas paciência. A gente já falou disso aqui e aqui.

Esta semana, numa entrevista em Campinas com um técnico de atletismo de alta performance, soube que há maneiras que podem ser mais confiáveis para se determinar os limiares aeróbios e anaeróbios do corredor.

Maneiras não invasivas e muito mais próximas da situação de competição, das situações de pista. Nada a ver com aquele porão iluminado por luz fria do Incor de São Paulo onde fiz o teste cardiorrespiratório. Tipo primeiro capítulo de “Twin Peaks”.

Luz fria, nem quente, iluminou o meu caminho de volta da mina Chico Rei, em Ouro Preto, outra situação cabulosa que me veio à cabeça. Essa é do tempo do Onça. Em algum momento dos anos 90, quiçá 80, eu percorria uma galeria da mina, que fica estranhamente dentro de um bar, quando as lâmpadas comuns, ligadas à rede elétrica do bar, simplesmente apagaram comigo lá dentro.

Não sei se tinha percorrido 1 ou 2 quilômetros, mas precisei, para voltar, experimentar a inédita sensação da escuridão total.

Consegui manter a calma, agachei-me para ir tateando o chão e depois do que podem ter sido 20’ ou 120’, impossível precisar, achei a tal luz no fim do túnel. Ao sair, esbaforido mas ileso, não havia ninguém no bar com quem reclamar. Ou, muito melhor, com quem compartilhar meu notável feito.

Curioso: não suava em bicas como agora no cinema, acompanhando Bullock. Francamente, não sei aonde fui buscar a calma necessária para sair daquela enrascada.

Assim como não sei aonde fui buscar a quietude necessária para manter-me agachado quando o interminável trem da Fepasa passou por cima das nossas cabeças, a minha e de outros três malucos,  socados dentro de um buraco de manutenção da ferrovia em Cerquilho, a 140K de São Paulo. Mas essa história, ao final bem divertida, é assunto para outro post.

Antes do Insano eu já havia conhecido alguns episódios de superação. Talvez por isso eu me incomode tanto com o uso indiscriminado dessa palavra no mundo da corrida.

 

 

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Paulo Vieira

Influenciado pelo velho “Guia completo da corrida”, do finado James Fixx, Paulo Vieira fez da calça jeans bermuda e começou a correr pela avenida Sumaré, em São Paulo, na adolescência, nos anos 1980. Mais tarde, após longo interregno, voltou com os quatro pés nos anos 2000, e agora coleciona maratonas – 9 (4 em SP, 2 Uphill Rio do Rastro, Rio, UDI e uma na Nova Zelândia), com viés de alta – e distâncias menos auspiciosas. Prefere o cascalho de cada dia às provas de domingo e faz da corrida plataforma para voos metafísicos, muitos dos quais você encontra nestas páginas. Evoé.

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