“Desafie seus limites”. “Supere-se”. “Persevere”. Você já deve ter lido esse tipo de mensagem no Facebook das assessorias esportivas ou até no dos colegas mais animados às vésperas de enfrentar um 5K, um 10K, uma meia. Eu, como já disse aqui, acho essa conversa motivacional para boi dormir.
Sim, estou longe de generalizar e estou sendo um tanto ranzinza. Faz parte da formação jornalística não mergulhar de peito aberto nas coisas que o mundo, ou as gentes do mundo, lhe mostra. Se você ouve a versão a, logo vai querer conhecer a a linha. Acho que os melhores jornalistas são aqueles que levam a sério o legado socrático.
De qualquer forma, na minha relação com a corrida, mesmo evoluindo nos “limites”, não me vejo superando, perseverando, desafiando a mim mesmo. Da meia feita aos trancos e barrancos para os 25K em 2:06′ e daí para o ida-e-volta ao Pico do Jaraguá houve uma evolução, mas não é algo de que eu me orgulhe especialmente.
Uma história bem diferente, contudo, aconteceu ontem, em Aquiraz, algumas braçadas de mar a leste de Fortaleza. Aqui fica o Beach Park, a que vim com a família e o fotógrafo ponta firme Caio Palazzo por amor de escrever uma reportagem que logo cruzará os céus do Brasil.
Aqui eu desafiei, perseverei e superei meus limites. Desde o fim da semana passada, quando aceitei a pauta, fiquei pensando se iria me jogar no Insano, o famoso tobogã de 41 metros – um prédio de 13 andares mais um ático que faz o incauto atingir a velocidade de 105km/h lá nas profundas. O maior toboágua do mundo.
No nosso primeiro dia no parque, domingo, andei namorando o brinquedo. Cheguei a subir à plataforma, entrevistei pai e filho que estavam para se jogar, falei com gente risonha que havia acabado de descer. Mas dei um jeito de criar desculpas para mim mesmo e deixei o dia passar.
Ontem o dia começou de maneira parecida. Entrevistei hóspedes do hotel do complexo do Beach Park, mais gente nas atrações, mas depois, da volta do almoço e com boa parte do trabalho resolvido, Caio falou: “Vou guardar a câmera e vamos no Insano.”
Não vi meu rosto nesse momento, e Caio não fez nenhum comentário certamente por educação, mas coisa boa não devia expressar.
No caminho passei pelas minhas filhas e pela Fernanda, disse onde íamos e ela exclamou: “Você também?”
Acho que era aquilo que eu precisava.
Subi os, sei lá, 300 graus da atração de dois em dois. Que se enfrentasse aquilo de uma vez. Todas as pessoas que eu via subir aquela escadaria ao longo dos dias e que pareciam condenados ao pelourinho indo tomar sua posição: eu não queria ser como elas.
Ao chegar no topo havia uma fila pequena, no máximo oito excitados parceiros.
Uma garota, junto ao salva-vida que organizava o brinquedo, falava e falava, e nada dela pular, oferecendo seu lugar aos seguintes da fila.
Logo chegava o momento de ela deixar seu lugar para mim.
Sem pensar muito cruzei os pés, coloquei as mãos atrás da nuca como se estivesse numa chaise-longue e me deixei deslizar pelos 5 ou 6 metros de descida suave do começo da atração.
E veio enfim o precipício e a queda vertical.
E num tempo mais rápido do que a leitura desta frase, já estava lá embaixo, na piscina. Não deu tempo de sentir medo ou frisson.
Assim como não deu tempo de enxergar o mundo lá embaixo.
Como numa festa, em que o melhor sempre é esperar por ela, o melhor do Insano foi ter mitificado o risco e a adrenalina do brinquedo. Esta é a minha terceira visita ao Beach Park. Antes disso sempre dei um jeito de evitar a coisa. Glamurizei a atração de uma maneira parecida com que o pessoal faz com as maratonas.
Desci o Insano. Desafiei meus limites. Superei.